As Placas CAMBION e os protótipos do NCE
Depoimento de Mario Ferreira Martins, analista e pesquisador aposentado do NCE/UFRJ sobre as placas utilizadas na montagem de protótipos de equipamentos desenvolvidos no antigo Núcleo de Computação Eletrônica como o Processador de Ponto Flutuante, o Terminal Inteligente e a CPU de Médio Porte. Este tipo de placa facilitava a correção dos quase inevitáveis erros de projeto (fase de depuração).
“Na implementação de protótipos com circuitos integrados utilizou-se no NCE placas da marca Cambion. Os integrados – em sua maioria da Texas ou da Signetics, sendo o microprocessador, no caso do Terminal Inteligente (TI), da Intel – eram ‘pastilhas’ retangulares em sua grande maioria com 14 ou 16 pinos (metade em cada lado ao longo do comprimento), e eram fixados em suportes chamados soquetes (também da Cambion). Os tais soquetes tinham do outro lado pinos correspondentes só que longos, retos e de seção quadrada. As placas eram vazadas, e, no fim da montagem, tínhamos integrados e soquetes de um lado e pinos longos do outro. As conexões eram feitas do lado dos pinos usando fios finos e uma pistola apropriada para enrolar os fios nos pinos (wire-wrap). Para ligarmos dois pinos cortávamos um fio com comprimento 3cm maior que a distância entre eles e desencapávamos 1,5cm em cada extremidade. A ponta (delgada) da pistola tinha um orifício maior no centro e um menor junto a ele. No menor colocávamos uma das extremidades desencapadas e posicionávamos a ponta da pistola para encaixarmos todo o pino no orifício maior e apertávamos o gatilho. O furo menor e, consequentemente, o fio girava em torno do pino. O fato deste ter uma seção quadrada garantia um contato perfeito. No início tínhamos pistolas manuais: à medida que pressionávamos o gatilho o fio ia girando. Havia também pistolas elétricas (havia também à bateria).
Alguns integrados tinham dimensões maiores – 24 pinos, p. ex. – mais longas e mais largas. Havia então, por causa disso, dois tipos de placas: ‘densa’, que aceitava integrados de até 16 pinos, e aquelas com fileiras de pinos sem interrupção que permitia um arranjo mais flexível e integrados maiores – placas ‘lisas’. Nesse tipo de placa, no entanto, cabia menos integrados do tamanho comum.
Quando o projeto exigia várias placas elas eram acondicionadas em uma estrutura chamada rack, também da Cambion, e como havia quatro tamanhos de placas havia consequentemente quatro tipos de rack um apropriado para cada tamanho de placa. (…) Antes que cada placa fosse colocada no rack normalmente eram feitos testes para verificar eventuais erros de fiação (teste estático). O Newton Faller desenvolveu um programa de fiação em meados dos anos 70 que listava todas as conexões de um projeto, facilitando a checagem nesta primeira etapa. Após essa fase, as placas iam sendo colocadas aos poucos (e não todas de uma vez só) e feitos os testes que eram possíveis.
Cada placa tinha, ocupando quase toda a largura de um de seus lados, um conector (macho) (ou um par, se a placa fosse de largura dupla) com duas fileiras de pinos (uma fileira do lado dos integrados e a outro do lado da fiação). No fundo de cada rack havia 13 conectores (fêmeas) correspondentes aos conectores das placas e que permitiam fixação das placas. Cada lateral da placa, vizinha ao conector, podia deslizar por canaletas (um par para cada placa) existentes no rack permitindo introduzir a placa até o fundo. Quando a placa chegava ao fundo do rack, sua fixação (física e elétrica) se completava com auxílio de duas ‘orelhas’ (uma em cada canto do lado da placa mais para fora) que também permitiam ‘desplugar’ a placa para retirá-la sempre que fosse necessário. Quando precisávamos medir algum sinal em uma placa utilizávamos um extensor: ele era simplesmente uma placa com 70 filetes (35 em cada face) tendo em uma de suas extremidades um conector macho similar ao de uma placa comum e que era encaixado no fundo do rack, e na outra extremidade um conector fêmea similar aos que havia no rack para fixação das placas. Desse modo a placa ficava inteiramente acessível para depuração.”
Parte traseira do protótipo do Terminal Inteligente, onde se pode ver as placas Cambion instaladas